cela me rassure d'avoir la confirmation qu'il est des choses qui demeurent intactes * philippe besson

one of the secrets of a happy life is continuous small treats * iris murdoch

it's a relief sometimes to be able to talk without having to explain oneself, isn't it? * isobel crawley * downtown abbey

carpe diem. seize the day, boys. make your lives extraordinary * dead poets society

a luz que toca lisboa é uma luz que faz acender qualquer coisa dentro de nos * mia couto





3.2.25

Quer frô?


Há pessoas que fazem parte da nossa vida sem nunca termos frequentado as respetivas casas e até sem lhes conhecermos o nome. 
Vejamos o senhor do adeus, que para muitos, só quando morreu soubemos que se chamava João.
Este senhor da fotografia é uma dessas pessoas que entra pelas nossas vidas com flores, anéis fluorescentes, bandelettes psicadélicas etc. 'Conheço-o', entre aspas, sim, desde a adolescência. Este senhor, na altura mais novo, como todos nós, e mais forte, percorria Lisboa a vender flores, nos restaurantes, e toda a parafernália que enumerei antes. Qual é a donzela que nunca recebeu uma 'frô' (dito com afecto) vendida por este senhor, numa qualquer rua do Bairro Alto? Eu recebi. Eu andei de anéis de borracha fluorescentes e de bandelettes psicadélicas nas noites da juventude. Este senhor, sem o saber, enchia as nossas noites de gargalhadas ou de romance. Na altura achávamos foleiro receber uma rosa destas, dizíamos que eram congeladas, que era parolo um gajo oferecer uma flor daquelas. Mas quase todos o fizeram. E no meio da vergonha pela entourage, que julgava bem ou mal aquele gesto, havia um sorriso interior. Tudo é uma questão de postura.
Não sei se os clientes se fizeram escassos, se o negócio teve maiores ambições, o senhor começou a alargar o perímetro e todos os fins de semana o vejo, ora em São Domingos de Benfica ora em Benfica. Qualquer que seja o restaurante onde esteja, ele aparece, sempre de ramo de flores em punho, sorridente, insistindo amavelmente para que lhe compramos uma flor.
O senhor, apesar dos tempo em que está em Portugal, fala pouco português. Gostava de lhe conhecer a história. Gostava que um dia destes se sentasse connosco à mesa e conversassemos sobre quem ele é, quem ele foi, como chegou aqui.
Tal como o senhor do adeus, cuja gentileza do gesto era um aceno generoso, uma imagem elegante numa rotunda da cidade, o senhor das flores vende rosas. Por vezes 'faz um preço',  outras oferece, tenho a certeza. As noites de Lisboa não são as mesmas sem a entrada dele num restaurante. Os romances não são os mesmos sem uma daquelas rosas, de pétalas sempre carnudas. 
O senhor. O senhor. Dou-me conta que não lhe conheço o nome. É importante sabermos o nome das pessoas? Absolutamente. Como pode uma pessoas destas ser anónima na minha vida quando a atravessa e atravessou tantos fins de semana?
No próximo encontro perguntar-lhe-ei o nome. Comprar-lhe-ei uma flor que me oferecerei a mim mesma e perguntar-lhe-ei que se aceitaria sentar-se connosco à mesa para beber um copo e para dois dedos de conversa.

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