alguém podia ter contado isto de melhor forma? não.
"(...) um outro leitor - talvez a minha ama - tinha-me explicado as formas e depois, de cada vez que as páginas se abriam para revelar a imagem deste exubrante menino, eu sabia o que as formas debaixo dele queriam dizer. havia nisto um certo prazer, mas depressa se esgotou. faltava a surpresa.
então, um dia, da janela de um carro (o destino dessa viagem está esquecido), vi um cartaz ao lado da estrada. não o devo ter visto durante muito tempo; talvez o carro tenha parado por um momento, talvez tenha abrandado o suficiente para eu poder ver, a pairarem em ponto grande, foras semelhantes às do meu livro, mas que eu nunca vira. no entanto, de repente, soube o que elas eram; ouvi-as na minha cabeça, o resultado de uma metamorfose de linhas pretas e espaços brancos numa realidade sólida, sonora e com sentido. tinha feito tudo isto sozinho. ninguém realizara a magia por mim. eu e as formas estávamos sozinhos juntos, revelando-nos mutuamente, num diálogo em respeitoso silêncio. ao conseguir transformar simples linhas em realidade viva, tornara-me todo-poderoso. sabia ler. (...)"
uma história da leitura, alberto manguel. lisboa: editoral presença, 1998
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